sábado, 22 de outubro de 2011

[Tradução] Entrevista ao The Huffington Post

Tori concedeu uma entrevista a Mike Ragogna, centrada no seu processo criativo, para o Night of Hunters e de um modo mais amplo, além de aconselhar a como jovens compositores devem se portar perante o som homogeneizado das rádios, atualmente. Para ler o original, clique AQUI.

UMA CONVERSA COM TORI AMOS

Mike Ragogna: Olá, Tori, como vai você?

Tori Amos: Oi, Michael, tudo bem?

MR: Excelente, agora que estou falando com você! Oh meu Deus!

TA: (risos) Você é divertido. Está falando de onde?

MR: De Fairfield, Iowa. É de fato um prazer.

TA: Bem, obrigado por me receber.

MR: Tori, seu novo álbum, Night of Hunters, é muito diferente de muitos dos seus outros álbuns, por ser só você, um piano e uma orquestra, tudo centrado em torno de um tema clássico. O que lhe inspirou a fazer isso, dessa vez?

TA: Bem, alguém da Deustche Grammophon me abordou - é o lado clássico da Universal. Foi um musicologista alemão, Dr. Alexander Buhr, que me encontrou enquanto estava viajando pelo mundo, e disse, “Ouça, tenho uma ideia para que você considere. Que tal fazer um ciclo de canções do século XXI baseado em temas clássicos?”, e eu olhei para ele e disse, “podemos começar a beber agora?”. Ele respondeu, “Olha, é um desafio. Eu sei que é um desafio, mas você tem escrito este musical, então deve saber como a narrativa funciona num ciclo de canções. E por quantas vezes lhe foi oferecido algo desse tipo?”. Eu disse, “Nunca. Nunca tive essa oportunidade, e se eu for fazer isso, preciso mesmo de que você me envie uma quantidade infinita de peças clássicas para que seja exposta a bem mais do que aprendi sozinha.”

MR: Houve peças específicas que tiveram ressonância em você mais que outras?

TA: Bem, sim - são as que entraram para o disco. E houve algumas outras que de fato tiveram ressonância, mas com a história você está sempre pensando, “Ok, ela precisa ter um início, um meio, um clímax e um final”, então tive de fazer duras escolhas, enquanto a peça de Chopin continuava voltando para mim. É engraçado como esses temas começam a lhe perseguir, porque eles perseguem mesmo! Honestamente, você está sentadinha, assistindo a um filme e comendo pipoca quando, de repente, lá está ela de novo! A peça de Schubert está no quarto, e daí você pensa “De onde você veio?”. Isso pode soar como “é assim que acontece de verdade”, mas o ponto chave aqui é que as canções exigem que você as respeitem. Além disso, muitas delas quiseram estar envolvidas nessa (re)expressão do século XXI, ainda que a maioria já tenha mais de 100 anos.

MR: Tori, como foi ouvir o ciclo quando ele estava concluído?

TA: Havia ouvido “Winterreise”, de Schubert, e a cada vez que dizia o nome da canção ao alemão, eu era corrigida em como deveria pronunciá-la. Eu estudei a peça, entendendo como a estrutura precisava funcionar. É bem diferente de um musical, mas existem similaridades. Então, o crucial foi decidir, “Ok, se é para ser uma Catedral - então como vou construi-la?”. Outro ponto fundamental foi chegar a “Shattering Sea”, que abre a história, demarcando-a como o momento em que se chega ao precipício, para daí trazer outra personagem que faria a narrativa aprofundar-se mais. Delineei a personagem, Anabelle, a qual é uma representação irlandesa e meio mítica da Deusa Tríplice ou da natureza, ou como você preferir percebê-la.

MR: A narrativa desenvolve-se belamente à medida que segue. Agora, você mencionou o musical no qual estava trabalhando, The Light Princess.

TA: Terá um nome diferente, mas o musical foi inspirado por “The Light Princess” (o conto), de George MacDonald. Estive trabalhando nele por uns cinco mil anos, sim. (risos)

MR: (risos) Então, este álbum foi construído de mãos dadas com o conceito de como está seu processo criativo no momento.

TA: hm, Sim. Acredito que a Deutsche Grammophon acertou em pensar que não seria capaz de fazer um ciclo de canção do século XXI, se não tivesse passado por todo o processo de escrever o musical, além da equipe criativa incrível com quem tive a grande sorte de trabalhar. Eles são do British National Theatre. Esta equipe está conectada a eles, de alguma forma. Eu estava tendo minha primeira experiência em narrativa de uma forma extremamente disciplinada, e sou grata por isso, ainda que tenha havido dias realmente negros no processo musical. Mas de fato, me ajudou a chegar num lugar em que eu podia entender o que o encarregado da Deutsche Grammophon estava me dizendo quando falou, “Por que você não escreve um ciclo de canções, mas baseado no século XXI... E lembre-se, ciclos de canções podem viajar no tempo e fazer o que você desejar, contanto que você tenha as fundações bem claras.” Por fim, acho que finalmente entendi aquela arquitetura. Depois de todos estes anos —aos 47— estava pronta para aceitar o desafio.

MR: Existem artistas —compositores clássicos—para os quais você tem uma noção mais clara agora, em oposição a de antes de fazer este projeto?

TA: Sim, completamente. Quero dizer, eu me sinto dessa forma sobre todos os compositores que estão no projeto. Todas as canções são variações em um tema, exceto uma, que foi inspirada por outra peça (Job’s Coffin, inspirada em Nautical Twilight), e foi tudo apresentado no álbum, quais são as originais e de onde vieram. Sempre tive muito carinho por Schubert, e uma vez que completei “Star Whisperer,” esta foi a primeira a realmente ficar pronta. São nove minutos e meio. Uma vez que a conheci, comecei a jogar fora todo tipo de coisa em que estava trabalhando, pois não era nada bom o bastante. Compreendi que “ok, este é o marco de referência, esta variação de Schubert. Tudo precisa fazer jus à ela”. Enfim, este foi o momento de ruptura.

MR: Quando você cria - mesmo antes deste projeto ou antes de começar a trabalhar no musical, digo bem antes mesmo, tanto quanto o Little Earthquakes - qual o seu processo para criar uma canção?

TA: O que você precisa ter é uma crueldade delicada. Você tem de ter, senão não ouvirá corretamente. Você precisa estar pronto para ouvir o que vem através do cosmos. Imagine que você está andando por uma rua em San Francisco, e você vê algo, e por ter visto, aquilo se traduz em som para um compositor. Portanto, ver significa que você ouve. Quando consigo ouvir algo, é como realmente o compreendo, e eu sei que pode parecer estranho para você, mas se está lidando com um tipo de éter da composição - é etéreo - e é preciso capturá-lo e fazê-lo tangível. Pois, tendo dito tudo isso, voltando ao Little Earthquakes, você tem seu instrumento, qualquer que seja—para mim, é o piano—e às vezes você toca somente para entender o que está sentindo. No entanto, uma vez que você faça isso, não se pode abandonar as coisas nesse estágio. É onde a crueldade delicada entra. Você não pode somente dizer, “Oh, foi porque sentia isso, que ótimo”. Não, frequentemente não é o bastante. Daí, você deve pegar sua talhadeira e começa a esculpir o achado em torno de uma ideia, até ter uma forma. Está é a maneira artística de composição de canções.

MR: Uma das minhas canções prediletas de Tori Amos é “Silent All These Years.” Me afetou profundamente quando a ouvi, não podia acreditar que estava ouvindo aquelas palavras vindas do rádio. Você recorda de onde veio esse momento de inspiração, e você recorda de quão bom foi ele?

TA: Bem, acredito que minha vida inteira foi uma preparação para esse momento. Foi uma das coisas que estava escrevendo por muito tempo, antes daquele sucesso. Então, não surgiu do dia para a noite - quero dizer, foram 27 anos de trabalho, considerando que comecei a tocar entre dois e dois anos e meio. Então, culminou naquilo depois de muitas, muitas, muitas - centenas de canções - terem sido escritas. Elas não necessariamente foram registradas, mas foram escritas. Então quando Little Earthquakes, aquele corpo de trabalho, estava saindo, não era como sendo minha primeira tentativa. Deve ter sido como o mundo o viu, mas ele só surgiu depois de muitos e muitos e muitos anos de composição.

MR: Tudo naquele álbum era penetrante e pungente. Tinha essa qualidade de “você TEM de ouvir isso”.

TA: Sim, essa foi a ideia para o álbum.

MR: Seus trabalhos em geral demandam atenção. É intencional?

TA: Bem, eu acho que fazer álbuns tem seu próprio tipo de-hmm, o que dizer - como poderia dizer em termos de surf? Como surfar uma onde de 25, 30 pés de altura. Vejo a produção de álbuns com o rico de ficar preso em algum tipo de dimensão da qual você não sabe se sai vivo. Muitas pessoas fizeram discos e ponto - nunca mais produziram outro, ou então produziram uns poucos, tiveram sucesso e ficou nisso. O fundamental em fazer discos é que isso exige uma disciplina real. Você precisa ser capaz de manter seu foco, sabendo que a mágica está lá. Você pode tocar algo umas cem vezes sem que essa tal mágica apareça, e não se sabe por quê, mas você simplesmente sabe quando está sentindo um retorno. Existe essa coisa elusiva, que faísca, aquilo que lhe faz querer tocá-la de novo. Como, “Você poderia tocá-la outra vez?”. É difícil definir estas coisas, mas um bom produtor começa a sentir isso naturalmente. É quase como se você fosse um caçador, caçando aquela frequência e o tom dela, havendo aí a necessidade de compreender o que é realmente dela ou não. Normalmente tenho uma equipe comigo, não sou só eu, nunca estou só nisso. É sempre sobre uma equipe quando você está produzindo um álbum, assim penso, sendo também sobre trazer pessoas distintas em momentos diferentes para fazer música em conjunto. Então, muito anos assim, fazendo discos ainda, faz com que jamais aborde um álbum casualmente. Não é um exercício casual. É (f**king) FEROZ! Mas há algo extremamente sexy nisso, também. É como se ouvisse surfistas falando sobre pegar aquelas ondas capazes de arrastá-los e matar. Bem, fazer álbuns pode ser semelhante a isso também. Surfistas perdem suas vidas. Não quero inferiorizar a experiência deles, mas eu conheço vários músicos que amam surfar e diriam, “a diferença em nossa analogia, T, é que nós podemos morrer.” E o que eu diria é, “sim, mas quantos músicos viram suas carreiras morrerem por fazerem o disco errado?”

MR: Perspectiva interessante, realmente. Agora, no passado, você deveria ter trabalhado com o grande Arif Marden. Esta seria uma experiência maravilhosa.

TA: Sim, eu devo dizer, fui muito afortunada por trabalhar com tantas pessoas incríveis durante esses anos. Fui realmente abençoada. Eu também amo trabalhar com Ahmet Ertegün, que se relaciona a Arif. Ahmet Ertegün dançou comigo em meu casamento. Sua sabedoria foi tão... Ele me deu conselhos verdadeiramente bons ao longo dos anos.

MR: Eu imagino que esta equipe da qual você se rodeou não só contribuiu em sua música, mas também em sua vida.

TA: Sim, absolutamente.

MR: Considerando seu catálogo absurdo, qual o conselho você daria a novos artistas?

TA: Que tipo de conselho?

MR: O que um novo artista deve fazer para, criativamente, alongar sua aventura?

TA: Bem, você precisa ter clareza sobre qual é o seu estilo, e precisa abraçá-lo, de modo que se você não estiver o amando, precisa expandi-lo. E você pode sempre expandir o que chamo de sua “paleta”. Mas é preciso manter em expansão seu vocabulário de cordas, e se você é um compositor, sua estrutura, pois o problema no século XXI está no seguinte: quantas vezes você não ouviu ao rádio e pensou, “Oh, espere um instante. Esta canção soa como essa outra canção, que soa como aquela também”. Veja, agora você descende na cadeia alimentar do século XXI, e uma série de compositores que vieram antes de você talvez escrevam usando estruturas similares às suas, então é desafiador. Novos artistas precisam ter ainda mais em seus arsenais do que tinham há 15 anos atrás se a ideia é ser original. Você precisa tocar com estruturas, e não somente ouvir a rádio de hoje. É necessário voltar a alguns dos grandes mestres e observar suas progressões de cordas, por ser um pouco diferente do derivativo que você escuta o tempo todo agora. Não quero dizer o tempo todo em todo lugar, mas está mais para o material óbvio do top 40.

MR: Bem, isso nos traz de volta à sua abordagem no Night of Hunters, seu ciclo de canções clássico, explorando os grandes trabalhos dos últimos séculos. Realmente gostei de ter passado esse tempo com você, Tori. Foi extremamente especial para mim, e certamente, também para os leitores. Obrigado outra vez.

TA: Obrigado. Tudo de melhor.

Fonte/Source: Undented

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